MANIFESTO datado ChatGPT & Educação

Dated Manifesto: ChatGPT & Education

Lucia Santaella

Generative AI and, in particular, ChatGPT fell like a meteor in the midst of contemporary societies, interfering in all areas of their activities.One of these areas, education, is affected in its entirety.More than a brief article, this text presents itself as a dated Manifesto that advances  considerations and courses of action that cannot be postponed.Any procrastination is inexcusable and will bring consequences.

O tema tem fervido em todos os meios de transmissão de informação, de notícias e de pseudo notícias: a IA generativa. Irei apontar para duas fases que, não obstante o pouquíssimo tempo transcorrido, já foram vividas desde a entrada impactante em dezembro pp do ChatGPT na vida individual e social.   

A primeira fase assemelhou-se a um abalo sísmico provocado pelo susto, mais do que surpresa com que o Chat surgiu como um relâmpago que tomou as sociedades humanas de assalto. Isso não foi casual, a IA agora veio à superfície, conversando como se fosse gente, e com uma facilidade interativa espantosa. Isso provocou um alvoroço disparatado, inclusive no campo da educação. Foram divulgadas proibições de uso do Chat por instituições na França e nos Estados Unidos. Uma solução que parece de prudência, mas apresenta também seu lado de alienação. Pelo não e pelo sim, é uma ingenuidade minimizar a quantidade de questões, para não dizer problemas a serem pensados e testados que o Chat traz para os processos de ensino-aprendizagem, para os efeitos potenciais no conhecimento e habilidades humanas e, especialmente, para as tradicionais modalidades de avaliação.

A segunda fase, que já se faz notar, em muitas áreas, mas para ficarmos na educação, indica sinais de movimentação para uma incorporação, em maior ou menor medida, razoável, ética, prudente e segura da IA generativa nos processos de ensino e aprendizagem. As redes já estão pontilhadas aqui e ali de divulgações dessas iniciativas, em paralelo com vozes que continuam a diagnosticar que esse será o fim da humanidade. Nas últimas semanas reuni um número significativo de divulgações pelas redes de estratégias de uso educacional do Chat. Seguem apenas alguns exemplos entre muitos que já estão correndo pelas redes:

– “Webnar gratuito: Chat GPT nas escolas: desafios e aprendizados para gestão.”

– Na Ciência: “professora ensina a usar o ChatGPT para ajudar na escrita científica.” 

– “Mapa do ChatGPT para artigo científico.”

– “Transforme o conteúdo do ChaGPT em livros bestsellers.”

– “10 regras para interagir com o GPT.”

– “20 estratégias para uso educacional do GPT.”

– “Saiba como usar o ChatGPT para potencializar a aprendizagem e conheça novas formas de avaliar os estudantes.”

Em suma: não é possível cobrir o sol com a peneira. Essa nova forma de inteligência está aí e está se impregnando cada vez mais, inclusive na educação. Portanto, isso demanda que a questão comece a ser pensada e mais bem-compreendida para além do episódico.

BREVE FLUXO TEMPORAL DA TECNOLOGIA E EDUCAÇÃO

Para não cairmos de paraquedas diretamente no terreno da IA e educação, é preciso recuperar um fluxo temporal relevante para chegamos aonde estamos. Não há educação sem a incorporação de mediações técnicas ou tecnológicas que, longe de funcionar como meros acessórios, conformam os sistemas e processos educacionais como um todo. Essas mediações começaram na cultura da oralidade e, em seguida, caminharam para a cultura da escrita e do livro. O status quo do livro vem sofrendo abalos e também passando por transformações desde o advento da cultura digital.

Digo abalos porque os sistemas educacionais, ainda presos a uma formatação nascida na cultura do livro e da transmissão sob as luzes do Iluminismo, viram-se obrigados a procurar chaves de mudança por meio de metodologias ativas, sala de aula invertida, metodologia baseada em projetos, mudanças no papel do professor etc. Os procedimentos pedagógicos também têm buscado inserções estratégicas dos inúmeros recursos digitais e online, de modo a extrair proveito educacional mesmo diante do império da atual plataformização da sociedade e da vida.

A educação, sob o ponto de vista das novas tecnologias, costuma ser chamada de educação midiática. De resto, um nome genérico, desatualizado que não quer dizer mais nada. Passou a era das mídias em si. Estamos agora vivendo na era das redes e da performatividade algorítmica. Portanto, o adjetivo midiático acaba por denunciar a tendência ao conservadorismo da educação.

Não é preciso muito conhecimento sobre a inserção dos recursos tecnológicos na educação para se dar conta de que tudo começou com os laboratórios de informática das escolas que foram envelhecendo na sua inutilidade conforme o computador foi cada vez mais se transformando em mídia de todas as mídias. Isso abriu caminho para cursos online que evoluíram naquilo que, há vinte anos, ficou conhecido como “ambientes virtuais de aprendizagem”, com seus “desenhos instrucionais” para o planejamento, desenvolvimento e avaliação de cursos online. Os nomes variam, mas o alvo é convergente, ou seja, a utilização dos recursos oferecidos pelo computador e seus complementos.

Nesse contexto, o termo bastante genérico para dar conta de uma série de procedimentos é e-learning, isto é, aprendizagem que se desenvolve por meio eletrônico.  A profusão terminológica não é sem razão, pois é indicadora das iniciativas pedagógicas para acompanhar pari passu a emergência de novos recursos tecnológicos. Surgiram assim a m-learning, aprendizagem móvel, e a u-learning, aprendizagem ubíqua.

Além dessas modalidades mais gerais, há ainda submodalidades marcadas pela especificidade de cada tipo de recurso. Desse modo, pode-se falar em app-learning, Novidade também é a aprendizagem adaptativa na qual o ambiente de aprendizagem, que é construído, busca oferecer adaptabilidade às necessidades e estilos de aprendizagem de cada estudante. Mas quando falamos em aprendizagem adaptativa, deparamo-nos com os recursos que levam essa condição a uma potência muito nova, ou seja, a inteligência artificial. De fato, aplicativos de IA, mais tardiamente do que em países do norte global, foram sendo postos em uso, nas escolas privilegiadas no Br, como facilitadores para a aprendizagem e sua gestão, o que não deixa de implicar que muitos cuidados sejam tomados para que não haja vazamento de dados pessoais e outros danos.

CHATGPT: UMA REVIRAVOLTA INAUDITA

A entrada do ChatGPT, contudo, significa uma reviravolta inaudita na educação. O mundo digital já havia provocado a emergência de um novo ecossistema de produção e transferência do conhecimento cuja complexidade só tem crescido. Em meio à convergência tecnológica e à ubiquidade que estamos vivenciando, os modelos educacionais tradicionais foram postos à prova. Entretanto, as instituições em quaisquer níveis de ensino, inclusive do nível superior, na costumeira inércia deste país, já haviam fechado os olhos para a nova lógica do conhecimento promovida pela digitalização interativa. Agora, entretanto, com a IA generativa, as instituições devem se colocar em uma corrida contra o tempo para recuperar minimamente as etapas perdidas.

Os jovens estão com a mão na massa do GPT. É inevitável que façam uso dele para todos os tipos de tarefas educativas ou não. Não há tempo a perder. Em vez de as instituições e outros tipos de comunidades ficarem à espera de regras universais de uso ou de proibições, sugere-se como primeiros socorros que sejam consensuadas regras ad hoc para cada tipo de comunidade como meio de preservação de uma possível trava ética. Como já escrevi em um blog recente, a IA generativa veio para colocar a ética humana à prova.

A grande questão que surge, em meio ao tsunami das mudanças, é como traduzir a tradição dos valores humanos que herdamos do passado e que não devem ser perdidos. Embora as mudanças nos hábitos adquiridos sejam inevitáveis, os princípios formadores que guiam os ideais da educação não podem ser abalados. Esses princípios, que visam ao desenvolvimento humano, estão na base da pedagogia e sua manutenção frente aos novos tipos de mediações exige a arte do cuidado e estratégias engenhosas. Não há receitas genéricas.

Cada nível de aprendizagem deve ser levado em conta. Estratégias válidas para um nível podem não caber para outros. Os aplicativos de IA para a educação buscam ou deveriam buscar a consideração dessas distinções. Mais do que isso, o que precisa ser considerado, quando se fala em IA e educação no contexto atual, é o fato de que com a IA generativa a IA mudou de figura, de fato, muito especialmente no que diz respeito à educação. Não há como evitar aquilo que chamo de invasão do GPT.  

Desde o ensino básico avançando para a educação continuada, esforços são necessários para promover a saída da pura curiosidade e do amadorismo. As instituições precisam sair da inércia. Antes de tudo, precisam desenvolver mecanismos fundamentais e gerais de regulação ética que visem às fontes, à concepção e à certificação desse sistema. Portanto, o Chat precisa ser acolhido e devidamente incluído nos códigos éticos das instituições.

Então, em cada situação e cada condição específica de ensino-aprendizagem, devem ser negociadas regras ad hoc para o uso sadio. Relações de confiança entre professores e alunos e o redesenho das etapas do processo educativo até as formas de avaliação são muito mais eficazes do que o mero policiamento dos estudantes.

Por enquanto, é o que me parece urgente, mas não estacionário. A mudança do ritmo da própria mudança, que é característica fundamental do contemporâneo, queira-se ou não, coloca o educador em estado de alerta permanente e infatigável.

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