Performatividade na arte: entre o corpo e o objeto[1]

por Clayton Policarpo 

[Abstract]:

“The text proposes an analysis of the relationship between artist and art object in contemporary works that use performative practices as a constituent element. Since performance has established itself as one of the most important paradigms of the 21st century, having been incorporated by science, politics, sociology, philosophy, we revisit the field of arts for to raise understanding of the term. The focus of research is the different agency levels of the performative object, and as work art that use the provisional, real-time action and materiality, makes use different elements in the construction of aesthetic experience.”

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Faust, 2017, de Anne Imhof. 
Instalação premiada com o Leão de Ouro na Bienal de Arte de Veneza.

 

Nas últimas décadas, a arte da performance passou por um processo de institucionalização que permitiu uma visibilidade enquanto prática específica, ao mesmo tempo que buscou separá-la de outras dimensões que não se autodefinem como tal, o que possibilitou um espaço de destaque no cenário artístico e a emergência de toda uma rede de estudos e pesquisa na área. A premiação da obra Faust, 2017, da artista alemã Anne Imhof, na 57ª Bienal de Veneza, definida pelo júri como uma “poderosa e inquietante instalação, que traz à tona muitos questionamentos sobre o nosso tempo”[2], coroou a prática como uma manifestação estética indispensável para se pensar o contemporâneo.

Arrisco, aqui, aproximações e leituras que, ao exceder as referências comumente utilizadas, denotam uma recorrência da performance em territórios díspares. O percurso adotado incide não só nos paralelos entre prática performativa e pesquisas científicas e socioculturais, como também propõe uma investigação dos diferentes níveis de agência do objeto performativo na arte. Esperamos traçar caminhos que corroborem na elucidação de dois aparentes paradoxos incutidos nos confrontos levantados: a (im)possibilidade de um aspecto não-humano da arte, e a performance para além do corpo do performer humano.

1. Performance como paradigma

As possibilidades que se anunciavam nos primórdios das tecnologias digitais e de rede apontavam para uma destituição da fisicalidade dos espaços de convívio e da materialidade da experiência em prol da criação de ambientes virtuais e simulacros. Hoje são suplantadas pelo estado de conexão em que estamos imersos. Com a evolução de dispositivos móveis e computação pervasiva, transitamos por entre fluxos informacionais e espacialidades físicas e, experiências que até então, pareciam intangíveis adquirem corporeidade. Neste contexto, questões que envolvem corporificação, localidade, presença e materialidade passaram a ser discutidas por profissionais das mais diversas áreas (artistas, designers, arquitetos, arqueólogos, cientistas, pesquisadores) adotam a performance, enquanto prática e método, elevando-a a posição de um dos maiores paradigmas do nosso século (SALTER, 2010, p. xxi).

A palavra “performance” permeia diversas áreas de pesquisa e atuação, desde política, negócios, até esporte, tecnologia e arte. A ampla variedade de campos de conhecimento aos quais é aplicada resulta em uma dificuldade de circunscrevê-la em uma definição clara e precisa, fato que torna o seu uso ainda mais convidativo e atraente. Em uma sociedade imersa em informação e cobrança, performance é comumente associada à eficiência, rendimento e utilidade: “empresas de alta performance”, “a performance do jogador”, “a performance dos equipamentos”.

Nas práticas socioculturais, a performance tem sido utilizada de maneira ampla, desde da década de 1950, para denotar a conexão entre ações práticas, situações encenadas e o processo geral civilizatório. O sociólogo Erving Goffman, em seu livro The Presentation of Self in Everyday Life, descreve o processo de construção de identidade social como uma forma de performance, “baseada em atos rotineiros e modos de interação social formatados pelo contato que temos com o ambiente cotidiano” (GOFFMAN, 1956, p.13). Contemporânea aos estudos de Goffman, a pesquisa do linguista inglês John L. Austin, utiliza pela primeira vez o termo “performativo”. Em How to Do Things With Words, 1959Austin enfatiza a performance como um agir ou fazer; o caráter performativo da linguagem que não apenas descreve ou representa uma ação, mas faz algo (AUSTIN, 1975, p.5). Por exemplo os enunciados: “eu aceito”, no contexto de um casamento, ou a frase bíblica “e fez-se a luz, e a luz se fez”.

Os estudos promovidos por Goffman e Austin criam a base para a teoria de gênero desenvolvida pela filósofa americana Judith Butler. Gender Trouble, publicado em 1990, é provavelmente o trabalho mais conhecido da autora; o livro é repleto de referências teóricas e evidencia a herança fenomenológica e hegeliana de Butler (SALIH, 2012, p.64). O gênero, segundo a autora, não é uma identidade ontológica estável e predefinida, mas se constrói no tempo através de eventos e atos performativos. Em tal perspectiva, o processo de construção de gênero é mais baseado na repetição de ações, do que em modelos inevitáveis e absolutos (BUTLER apud SALIH, 2012, p.68).

Diversas práticas de pesquisa, a exemplo sociologia, antropologia, filosofia e linguística, ampliam o campo de estudos para os processos, descentralizando a legitimação pelo discurso e métodos estruturalistas. A adoção de tais modelos, que deu início nos anos 1970, é cada vez mais recorrente. Sob tal perspectiva, preza-se por expandir a produção e transmissão de conhecimento para além do estritamente textual, assumindo o tácito, não-verbal, imanente e material como constituintes da investigação científica.

Diante do avanço dos dispositivos tecnológicos (inteligência artificial, computação ubíqua, internet das coisas, big data), e em decorrência das mudanças climáticas, estratégias de pesquisa que enfocam nos processos e na performatividade dos agentes contribuem para repensar os modelos antropocêntricos de produção de conhecimento. No campo da arte, identificamos um território propício para expandir além dos modelos epistêmicos tradicionais; uma vez que esta reluta a uma definição totalizadora, e lida com uma linguagem e modo de pensamento que não podem ser substituídos por qualquer outro sistema disciplinar.

 

2. Arte e performance

Com a origem que remonta às experiências realizadas pelos surrealistas e, sobretudo, dadaístas, a performance ganha fôlego nos anos 1960 e 1970 ao propor experiências díspares e questionar o modelo social e artístico do modernismo. Nesse período, o debate na arte pelo mundo intensificou a necessidade de transgredir o sistema clássico de criação, o que refletiu no surgimento de artistas ocupados na produção de obras experimentais marcadas por uma ideia de mudança contínua. Com o grupo Fluxus, a prática performativa atingiu um patamar inédito. O trabalho de arte como uma obra aberta foi um conceito que percorreu a produção do grupo, em uma produção que, mais do que interativa, é viva.

No Brasil, Flávio de Carvalho é reconhecido como um dos pioneiros. Em 1931, em sua Experiência n. 2, o artista coloca um chapéu e entra no sentido contrário de uma procissão de Corpus Christi no centro de São Paulo. Para Carvalho, suas experiências possuíam um caráter de pesquisa; “em uma época em que uma política das massas implica em uma mudança no regime de visibilidade e legibilidade dos espaços públicos, o pesquisador perde se não mergulhar em seu objeto e não o ativar para observar ou sofrer suas reações” (CARVALHO, 2001).

A performance, comumente caracterizada pela ação do artista, pelo tempo real e pela materialidade do evento, adquire aos poucos um caráter transversal a diversas práticas contemporâneas. Ao trazer a hibridização como um elemento fundante, seja pela mescla de gênero (o teatro, as artes plásticas, a música) ou mídias (pintura, fotografia, vídeo); assume a tecnologia como um elemento intrínseco em sua produção e desenvolvimento. Uma evidência da onipresença da performance em diferentes gêneros artísticos, é o livro A máquina performática: a literatura no campo experimental, de Gonzalo Aguilar e Mario Cámara, pautado por um resgate do caráter performativo da literatura brasileira e que “excede a hegemonia textual como única fonte de autoridade, mas não a textualidade em si mesma” (AGUILAR; CÁMARA, 2017, p.12).

É fato que performers humanos agem e se apresentam em diálogo com o espaço, tecnologia e objetos externos ao corpo; direcionando-os para seus objetivos específicos. Contudo, algumas questões vêm à tona: como os ambientes, máquinas e substâncias podem performar na arte, mesmo quando isentos de consciência ou intenção? Para além de medidores de eficiência, podem os objetos performar a fim de incorporar uma expressão genuína?

A atribuição de agência a elementos não-humanos não é uma pauta inédita. Diversos artistas investigam o potencial de interação entre o corpo e elementos externos, por vezes dotando-os de protagonismo. Marina Abramovic, considerada a “avó” da performance e com uma produção amplamente reconhecida, em uma conversa com o público, realizada dentro de sua mostra em 2015, no Sesc Pompéia[3], foi questionada se objetos podem performar. A resposta da artista foi positiva, exemplificando um campo de emanações que certos objetos ritualísticos detém. No livro Performance como Linguagem (2013), Renato Cohen afirma que “o atuante não precisa ser necessariamente um ser humano” (ibid. p. 28). Citando como exemplo instalações e objetos criados pelo artista brasileiro Guto Lacaz, Cohen propõe uma radicalização do conceito de atuante “que pode ser desempenhado por um simples objeto, ou uma forma abstrata qualquer” (ibid.),

Ao selecionar o objeto de arte como o enfoque, apoio nas linhas de força que cruzam a prática da performance, para identificar três momentos: o corpo como objeto, o objeto como obra, o objeto que produz a ação. O intuito é explorar os diferentes níveis de interação e autonomia do objeto performativo. Os modelos de leitura propostos não buscam um caráter classificatório ou historicizante, uma vez que se afetam e se constituem mutuamente. O aspecto de performatividade dos objetos, mais do que focar nas técnicas empregadas ou período de criação, reconhece aberturas de fluxos e interferências, e a interdependência de um circuito de inserção.

2.1. O corpo como objeto: o artista está presente

Em 2010, o MoMA promoveu uma retrospectiva da obra de Marina Abramović, ocupando seis andares do museu, na maior exposição já realizada em homenagem à artista. Para a ocasião, Abramović desenvolveu uma performance, executada diariamente durante o período da mostra. A obra A Artista Está Presente enfatizou a força que é atribuída à ação e presença do artista em uma performance: em um cenário composto por uma mesa e duas cadeiras, Abramović se predispôs a olhar para os visitantes que se sentassem diante dela. Embora hajam diversos registros, o que inclui um longa metragem dirigido por Matthew Akers e Jeff Dupre, e um livro de retratos editado por Marco Anelli, a experiência estética pertenceu aos espectadores que se sentaram e trocaram olhares com a performer. A documentação refere-se a um evento que tem uma existência anterior e autônoma.

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The Artist is Present, 2010, Marina Abramović.

Ao atribuir ao próprio corpo o status de objeto de arte, a ação é a obra. A performance passa a ser desempenhada pelo artista dentro de um limite espaço-temporal, o que torna a documentação uma representação pálida da ação. Em 1971, Chris Burden pediu para que um amigo lhe desse um tiro em uma galeria, ação que ficou conhecida como Shoot. A obra é um exemplo das limitações enfrentadas pela tentativa de captação de uma ação performativa stricto senso. As fotografias e textos produzidos na ocasião são documentações para a posteridade, ilustram uma ação concluída em uma circunstância específica, mas não recriam o “momento arte”.

2.2. O objeto como obra: a arte depois da performance

Para além do performer como objeto de arte, as inscrição do corpo, gestualidade ou ação do artista no objeto são obras que se apresentam sob o estigma da performance. Neste modelo, não há um contexto rígido e imutável, o objeto de arte já não se encerra em um ato realizado, mas ganha materialidade e promove a experiência estética nos resquícios da ação. A obra é o próprio registro, conectado de modo indicial ao ato do artista, que pode ter sido realizado sem um público presente.

Nos anos 1950, Jackson Pollock partiu de uma investigação em pintura através de experimentações da técnica e da linguagem pictórica. A tela deixou o cavalete vertical e passou a ocupar o chão do ateliê, onde Pollock imprimia sua gestualidade em uma espécie de “dança”, que explicitava o ato físico de pintar ao tempo que ampliava as dimensões de ação do corpo dentro da pintura (CUFER, 2012, p.24). Contemporâneas aos trabalhos de Pollock, as telas “cortadas” de Lucio Fontana demonstram uma pesquisa de espacialização e gestualidade. O rasgo é a inscrição de uma ação do artista, e remete a um movimento do corpo que é anterior à exibição e contemplação da obra. De modo semelhante, Yves Klein substituiu o pincel e passou a produzir pinturas a partir do corpo de performers. Em ações criadas pelo artista, corpos nus, e repletos de tinta azul, eram utilizados como instrumentos na execução de painéis bidimensionais.

Além de objetos pictóricos, o registro com dispositivos tecnológicos, sejam por fotos ou vídeos, também criou obras que, mais do que a documentação de ações, configuram-se como o próprio objeto de arte. Desde os anos 1960, artistas se apropriam das possibilidades advindas das máquinas de comunicação e linguagem, e criam ações encenadas para a lente das câmeras. Ao substituir o público pelo dispositivo, produzem documentações que estabelecem uma relação de caráter ontológico entre o gesto e o objeto de arte.

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Pintura Habitada, 1975. Helena Almeida.

Em sua série Pintura Habitada, de 1976, a portuguesa Helena Almeida criou autorretratos que, após revelados e impressos, receberam intervenções em tinta azul; estabelecendo diálogos entre ação documentada e tinta posteriormente aplicada. A obra de Cindy Sherman, composta por autorretratos em que a artista encarna personagens, figura como bom exemplo de registro fotográfico que, mais que uma representação imprecisa, é a própria obra. Da mesma forma que a fotografia, os recursos de vídeo se abriram como um método de experimentação em performance. Em Marca Registrada, 1975, a artista Letícia Parente, munida de uma câmera, registra a ação de “bordar” na sola do pé as palavras MADE IN BRAZIL. Tal obra, considerada precursora na vídeo-arte no país, é um exemplo que pode ser disposto nesta categoria, o objeto como obra.

2.3. O objeto que produz a ação: performers não-humanos

A história da arte é também uma história dos objetos. Na arte contemporânea é através do circuito de inserção da obra/objeto que lhe atribuímos um “valor artístico”, por vezes, independente das intenções ou ações do próprio autor. Contudo, a identificação da rede de agentes que constituem a experiência estética, embora denote certo grau de protagonismo do espectador, é insuficiente para a compreensão da ação dos objetos, ou dos níveis de interação e autonomia que lhes são intrínsecos.

Em 1964, Nam June Paik propôs a construção daquele que seria o primeiro performer andróide da história (GIANNETTI, 2010, p.30). O Robô 456 podia simular funções humanas simples, como movimentar os braços e pernas, caminhar ou emitir sons. Controlado por um radar de 30 canais, o robô construído por materiais de sucata, participou ativamente de várias ações e concertos de Paik. Em 1982, por ocasião da retrospectiva do artista no Museu Whitney de Arte Americana em Nova York, em seu trajeto pela quinta avenida, K456 foi atropelado por um carro, na última ação experimentada pelo performer não-humano (ibid.). A atribuição de agência a objetos, até então inanimados, através de circuitos mecânicos e elétricos é uma prática recorrente; o artista multimídia Guto Lacaz cria “geringonças” que tendem a reproduzir movimentos e comportamentos durante suas exibições.

A evolução de tecnologias digitais e sensores tendem a complexificar os modelos de interação e emancipação dos objetos buscando, por vezes, uma superação do humano. Stelarc propõe a implementação de próteses ao obsoleto corpo humano. O artista realiza ações que dividem o protagonismo com objetos inorgânicos acoplados ao próprio corpo, e evidencia as limitações do homem frente a ininterrupta evolução maquínica.

Embora a performance do objeto seja evidenciada pela a adoção de dispositivos tecnológicos, sua capacidade de agência não se limita ao uso de tecnologia. Em sua série Bichos, 1960, Lygia Clark criou esculturas metálicas que, articuladas em diferentes níveis, possibilitam a manipulação e criação de inúmeras formas geométricas. Na descrição da artista, “um organismo vivo, uma obra essencialmente atuante. Entre você e ele se estabelece uma integração total, existencial. Na relação que se estabelece entre você e o Bicho não há passividade, nem sua nem dele” (CLARK, 1960).

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Nympheas Transplant, 2014, Pierre Huyghe. 
Ao fundo, a escultura La Déraison, 2014, também de Huyghe.

Investigações mais recentes, acerca da atuação de objetos não-humanos na arte, incluem a construção de ecologias híbridas que, em seu processo, adquirem diferentes graus de autonomia. Pierre Huyghe explora a combinação de diferentes agentes na efetivação de suas obras: organismos, rochas, seres-vivos, dispositivos tecnológicos, vídeos etc. O trabalho Nympheas Transplant, 2014, é baseado no ecossistema da lagoa dos jardins de Claude-Monet, em Giverny, França, tema recorrente nos quadros do pintor. Em um aquário, construído com vidros inteligentes, sensíveis a voltagem, luz e calor, o artista recria um ecossistema. Plantas, peixes, anfíbios, crustáceos e insetos, remetem aos encontrados na lagoa de Monet. Sobre o tanque está uma caixa de luz que, em sua programação, intercala entre a reprodução das condições climáticas da região da lagoa natural, nos anos de 1914 a 1918; horas de luz especializada para a manutenção do ecossistema, e horas de escuridão. A justaposição de peças distintas, agentes orgânicos, tecnológicos, produz uma unidade, que permanece em constante movimento. As interações geradas entre os elementos que a integram é que a possibilita existir enquanto manifestação estética. Em uma relação de interdependência mútua, objetos realizam acoplamentos e interagem, em virtude de suas aberturas e dos fluxos que transmitem. São criados diálogos que alimentam o sistema da obra, e não são expressos ao visitante, o elemento vivo na obra é incontrolável, ainda que tenham sido inserido em um espaço delimitado, as interações que estabelecem extrapolam quaisquer previsões do artista. É um objeto pulsante!

 

3. Dos enlaces entre corpo e objeto

O presente texto propôs uma leitura da relação entre artista e objeto de arte, em obras contemporâneas que utilizam de práticas performativas como elemento constituinte. Embora o título possa evocar uma dicotomia entre o corpo e o objeto, visto que ambos conceitos são comumente apresentados como estanques e bem delimitados; me ocupo em explorar o “entre”, e suas gradações e mesclas em um determinado recorte observável. A inconstância das fronteiras aparentemente rígidas que se desfazem em um movimento constante.

O performativo (que denota um caráter de processualidade no campo sociocultural, e contribui para a construção da identidade do sujeito), aplicado à arte, dilui os limites entre corpos e objetos, sujeito e obra. Visto que a arte contemporânea é composta por elementos relativos e temporários, que permite uma troca sincrônica de conhecimento, a experiência estética não pode ser vista como rígida e se apresenta em eventos, momentos-arte. É a partir da estabilização temporária de uma série de elementos que podemos compreender as dinâmicas que ali se formam. A obra de arte, por si só, já é dinâmica e viva.

O enfoque no objeto, dentro do circuito da performance, permite que exploremos as relações sob um prisma menos condicionado, ao tempo que traz a tona questões que estão no cerne da pesquisa e prática da arte performativa, tais como relação obra e registro e os aspectos não-humanos na experiência estética. É ao provocar o ruído advindo dos objetos que esperamos incitar novas perspectivas que possam contribuir na produção e leitura de trabalhos que se identificam em tal modelo.


 

[1] O texto é parte do trabalho Objetos performativos na arte contemporânea, apresentado no Seminário sobre Design Digital e Inteligência Coletiva, ministrado pelo prof. Dr. Marcus Bastos no programa de estudos pós graduados em TIDD – PUC-SP.

[2] PRESSE, France. Bienal de Arte de Veneza premia com o Leão de Ouro a alemã Anne Imhof . Texto publicado em: 13/05/2017. Disponível em: <http://g1.globo.com/pop-arte/noticia/bienal-de-arte-de-veneza-premia-com-o-leao-de-ouro-a-alema-anne-imhof.ghtml >. Acessado em julho de 2017.

[3] Os registros dos encontros com Marina Abramovic na exposição Terra Comunal, realizada em 2010 no Sesc Pompeia, estão disponíveis no canal do Sesc. A questão acerca da performance dos objetos pode ser vista a partir de 1h8min no vídeo: <https://www.youtube.com/watch?v=0NaAYy4J760 >. Acessado em julho de 2017.

 

Referências bibliográficas

AGUIAR, Gonzalo; CÁMARA, Mario. A máquina performática: a literatura no campo experimental. Rio de Janeiro: Rocco, 2017.

AUSTIN, John L. How to Do Things With Words. 2ª ed. Cambridge : Harvard University Press, 1975.

CARVALHO, Flávio de. Experiência n.2, realizada sobre uma procissão de Corpus Christi: uma possível teoria e uma experiência. Rio de Janeiro: Nau, 2001.

CLARK, Lygia. Bichos: Livro-Obra. Rio de Janeiro: Associação Cultural Lygia Clark, 1960. Texto disponível em: <http://issuu.com/lygiaclark/docs/1960-bichos_p/3?e=0&gt;. Acessado em julho de 2017.

COHEN, Renato. Performance como Linguagem. 3a edição. São Paulo: Editora Perspectiva, 2013.

CUFER, Eda. Don’t! In.: WOOD, Catherine. A Bigger Splash: Painting after Performance. Londres : Tate Publishing, 2012.

GIANNETTI, Claudia. O sujeito-projeto: metaformance e endoestética. In.: PERISSINOTTO, Paula. Teoria Digital: Dez anos do FILE – Festival Internacional de Linguagem Eletrônica. São Paulo : Imprensa Oficial : FILE, 2010.

GOFFMAN, Erving. The Presentation of Self in Everyday Life. Edinburgo : University of Edinburgh, 1956.

SALTER, Chris. Entangled: Technology and the Transformation of Performance. MIT, 2010.

SALIH, Sara. Judith Butler e a Teoria Queer. Belo Horizonte: Editora Autêntica, 2012.

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